Mataram El-Rei | 1 de Fevereiro de 1908
Regressavam de Vila Viçosa após uma temporada de diversão no Palácio de Caldo, os relógios marcavam pouco mais das 5 e meia da tarde daquele dia 1 de fevereiro de 1908. Na entrada da ala poente do Terreiro do Paço, assassinaram o rei D.Carlos e o príncipe herdeiro, sem dó nem piedade.
Muito falamos em datas históricas contudo o regicídio de 1908 nunca merece uma publicação à altura. Foram precisos quase 770 anos de monarquia portuguesa para matarem um rei em plena hasta pública. Na época foi o acontecimento mais mediático e esta notícia correu o mundo sendo que surgiram várias versões. Hoje trago-vos aquela que os livros me contaram!
O reinado de D.Carlos foi marcado por grandes agitações populares e pela maçonaria republicana logo desde o início do governo. A família real era o maior devedor do Erário público sendo que D.Carlos era o rei da Europa que mais dinheiro recebia, seria 1 conto de reis por dia. Aos escândalos financeiros, junta-se a propaganda republicana e a criação de novos partidos como o Regenerador Liberal liderado por João Franco e como a Dissidência Progressista formada por Alpoim. Com a população pobre e a viver em condições miseráveis, podem imaginar o estado de Portugal no final do século XIX.
A 30 de janeiro de 1908, D.Carlos assina o decreto que prevê o exílio ou a expulsão para as colónias de indivíduos que atentassem à ordem pública. Lenda ou não acredita-se que ao assinar o rei afirmou "Assino a minha sentença de morte mas os senhores assim o quiseram". Contudo, o decreto foi publicado apenas no dia 1 de fevereiro e a preparação do atentado terá começado logo no dia 28 de janeiro.
Numa carruagem (landau) , vinham os reis de portugal sentados um ao lado do outro no banco de trás. À frente de D.Carlos estava o príncipe D.Luís Filipe, da rainha estava o infante D.Manuel. Já no Terreiro do Paço eram esperados pelo povo com saudações e aclamações no amplo largo. A carruagem circulava com lentidão entrando na ala poente do local.
Nesse momento, a família real ouviu um primeiro tiro mas sem ter tempo para compreender, um segundo disparo acertou no rei. Em segundos, o Terreiro do Paço transformou-se numa batida de caça! Um homem sai pelas arcadas em direção à carruagem, disparando duas vezes sobre D.Carlos. A rainha age sem pensar, erguendo-se sobre a carruagem para bater com um ramo de flores num dos agressores gritando "Infames! Infames!".
A verdade é que já não havia nada a fazer sem ser fugir do local. O corpo do rei estava inanimado e o príncipe D.Luís estava em pé com uma arma pronto para defender a sua família. Ao seguirem para a rua do Arsenal, D.Manuel percebe que também o seu irmão e futuro rei tinha sido atingido e jorrava sangue por todo o lado. O infante ainda tentou estancar a hemorragia da face mas também ele tinha sido atingido por um tiro no braço. Ao chegarem aos portões do hospital Arsenal da Marinha, foram rapidamente socorridos mas já sem sucesso para o rei e príncipe herdeiro.
Apenas quando desceram da carruagem e já estavam a salvo é que a rainha D.Amélia e o seu filho mais novo perceberam que tinham ali perdido o seu chão em pouco mais de 5 minutos. Ao descer da carruagem, a rainha dirigiu-se a João Franco e como uma viúva ferida e uma mãe que perdeu o seu filho gritou "matarem el-rei, mataram o meu filho", acabando por perder os sentidos e desmaiar. Quem também recebeu a notícia no local foi a rainha D.Maria Pia (mãe do rei D.Carlos) que transtornada acusou João Franco de ter proporcionado este trágico desfecho devido à impopularidade da sua política, apesar de apoiada pelo rei.
Os autores deste homicídio, Manuel Buiça e Alfredo Costa, foram mortos no local por membros da Guarda Real. Apesar de ter sido notícia em todos os jornais da Europa, este acontecimento acabou por não ter sido investigado temendo, o governo monárquico, implicações. Após a implantação da república, dois anos depois, o assunto morreu! O regicídio foi o início do fim da monarquia, um acontecimento que escreveu o final desta história e o começo das ideias republicanas em Portugal.